O atrasador de jornal

outubro 30, 2008

 

Nas postagens mais recentes, comentei como o jornalismo ganhou em dinamismo com o advento das novas tecnologias, especialmente aquelas que surgiram na cola da internet. Com a necessidade de exibir o “fato no ato”, as redações passaram a exigir mais agilidade de seus profissionais, ainda pouco adaptados às ferramentas do “tempo real”.

 

Eu, particularmente, sempre enxerguei com bons olhos as inovações tecnológicas e sou entusiasta no que se trata da aplicação de novas tecnologias na prática jornalística. Desde que o computador se tornou inseparável na rotina de um repórter, os jornais exploraram novas formas de pesquisa, interação, linguagem e, acima de tudo, ditaram um novo ritmo ao modo de vender informação.

 

Mas, confesso, hoje em dia a profissão não tem a mesma essência de quando uma caneta no bolso e um bloco de papel eram suficientes para fazer qualquer acontecimento ganhar forma de notícia no jornal. Houve um tempo em que a insubordinação do jornalista a rotinas industriais era vista como heroísmo pelos colegas, que gostavam de debochar uns dos outros chamando-se mutuamente de “atrasadores de jornais”.

 

Já que toquei no assunto, vou contar um episódio protagonizado por Caco Barcellos – um célebre atrasador de jornal. Era a terceira noite de trabalho dele como redator do “Jornal da Tarde”. No intervalo do expediente, Barcellos saiu para tomar café quando viu uma multidão aglomerada no hotel em frente. O repórter não resistiu e foi ver o que era: um homicídio tinha acabado de acontecer. Com a notícia à sua frente, ele só voltou à redação à 1h30.

 

Mesmo com o furo na ponta do lápis, Caco Barcellos ouviu a bronca: “Você está louco, seu irresponsável!”. A edição do jornal estava quase fechada, mas imediatamente o repórter sentou-se em frente à máquina de escrever e bateu uma matéria de página inteira sobre o homicídio. Daquele dia em diante, ele ficou um mês no Jornal da Tarde atrás de notícias.